Quase 20% dos refugiados Rohingya testados nos campos de Cox’s Bazar, em Bangladesh, têm uma infecção ativa causada pela hepatite C. Esta é a descoberta de um estudo recente realizado por Médicos Sem Fronteiras (MSF) e Epicentre, centro de epidemiologia e pesquisa médica da organização internacional. Este número alarmante destaca as consequências de décadas de assistência médica inadequada e condições de vida difíceis, caracterizadas por violência, discriminação e insegurança.
O estudo, realizado com 680 famílias em sete campos de refugiados entre maio e junho de 2023, ainda revela que pelo menos um em cada três adultos Rohingya foi exposto ao vírus e que quase um em cada cinco tem hepatite C crônica ativa. Desde outubro de 2020, MSF ofereceu cuidados médicos a mais de 8 mil pacientes, mas mesmo esse número de consultas não é suficiente para atender às necessidades.
Nos campos, as pessoas têm opções muito limitadas de diagnóstico e tratamento. MSF está pedindo um esforço humanitário conjunto para combater a doença entre essa população apátrida já privada de direitos básicos e fortemente dependente de ajuda para sobreviver.
“Nossas equipes têm que recusar pacientes todos os dias, porque a necessidade de cuidados excede a capacidade de atendimento da nossa organização. Quase não há outras alternativas disponíveis e acessíveis para esses pacientes fora de nossas clínicas nos campos. Este é um beco sem saída para uma população apátrida privada dos direitos mais básicos “, continua Sophie Baylac, chefe do projeto de MSF em Bangladesh.
Os refugiados não têm permissão legal para trabalhar ou deixar os campos. Para aqueles que MSF não pode tratar ou pagar por testes de diagnóstico e medicamentos caros, obter cuidados adequados fora dos campos não é uma possibilidade. “A maioria dos refugiados simplesmente não pode ser curada e recorre a métodos alternativos de tratamento, que não são eficazes”, diz Sophie Baylac.
“Acolhemos com satisfação o anúncio da Organização Mundial da Saúde (OMS), da Organização Internacional para as Migrações (OIM) e da Save The Children de que 900 pacientes com hepatite C serão tratados em dois centros de saúde nos campos. Este é um passo importante na direção certa. No entanto, uma campanha de prevenção em larga escala para ‘testar e tratar’ é necessária para limitar efetivamente a transmissão do vírus e evitar complicações hepáticas graves e mortes. Para isso, será necessário o envolvimento e a determinação daqueles que coordenam a resposta humanitária nos campos de Cox’s Bazar. Cada geração de refugiados que vivem nos campos é afetada pela hepatite C. Eles correm o risco de complicações hepáticas graves – que não são tratáveis em ambientes de campo – e podem morrer por causa disso, apesar da existência de um tratamento muito eficaz, bem tolerado e amigável ao paciente (um comprimido por dia durante três meses) que pode ser barato.”
As diretrizes da OMS e os modelos simplificados de tratamento usados por MSF em contextos semelhantes provaram ser eficientes para ampliar o tratamento da hepatite C com resultados muito bons em cenários humanitários de poucos recursos.
Nos últimos dois anos, MSF também apoiou o Ministério da Saúde de Bangladesh na elaboração de diretrizes clínicas nacionais para o tratamento da hepatite C. MSF está pronta para continuar trabalhando com autoridades nacionais, organizações intergovernamentais e não governamentais para implementar atividades de prevenção e promoção da saúde em larga escala, bem como uma campanha em massa de testagem e tratamento em todos os campos de Cox’s Bazar para limitar a transmissão do vírus e tratar o máximo de pacientes o mais rápido possível.
© Médicos Sem Fronteiras (MSF)